Um relacionamento conturbado com a tristeza


 "O que você não tem mais que te entristece tanto?"

Logo nas primeiras páginas de A Natureza da Mordida, Carla Madeira vem com essa indagação. Uma frase simples que me atingiu forte no peito, em um momento que eu tento lidar com a minha tristeza. Me perguntei se havia perdido algo que acabou por me entristecer e a resposta em que cheguei me deixou assustado e, talvez, um pouco mais triste.

Eu perdi minha liberdade.

Eu não acredito que sejamos livres de verdade no mundo em que vivemos hoje, mas eu comecei a notar que perdi até mesmo a ilusão de ser livre. Antes, eu sabia que podia fazer minhas escolhas e realizar meus objetivos dentro do que eu conseguia. Hoje eu não consigo mais. Eu me sinto preso. A um sofá, ao celular, ao feed eterno de vídeos curtos e verticais que sequestram meu tempo e minha atenção e fazem toda e qualquer atividade, que não seja olhar para a tela de uma rede social, se tornar a atividade mais entediante e dolorosa de ser realizada.

Eu olho para as pessoas ao meu redor e é impossível não me comparar. Todos parecem levar suas vidas bem, conseguindo conciliar todas as atividades que escolheram fazer e ainda sobra tempo para curtir o final de semana. A mim, mal sobra energia para finalizar o dia. 

Não estou escrevendo isso como um pedido de socorro. Na verdade, nenhum dos meus textos é um pedido de socorro. Todos são um desabafo, um meio muito eficiente de colocar a minha cabeça confusa em ordem e tirar um pouco do peso que se mantém constante durante esses momentos de crise. Mas embora não seja um pedido de socorro, pode servir como um recado para quem está perto de mim. Um recado que diz "me desculpe, mas estou tentando viver enquanto sou o meu pior eu". 

Um pouco exagerado, talvez. Eu entendo. Mas é dessa forma que eu me vejo. Obviamente eu reconheço que tenho qualidades, que eu melhorei e evoluí como ser humano nos últimos anos (os quase 3 anos de terapia me ajudam a enxergar isso). Só que a mesma coisa que me faz ter consciência da minha parte boa, me faz ter uma consciência dolorosa da minha parte ruim e em momentos de fragilidade, essa consciência é deturbada e se transforma numa falsa verdade. Uma falsa verdade que me tortura e me afasta de quem eu quero ser.

Eu tenho tentado sobreviver todos os dias a essa maldita "verdade", mas é dificílimo. O esforço que é tentar se mover e agir quando o peso do mundo parece tentar te esmagar é terrível e chega um momento que a vontade é só desistir. Mas se eu desistir, o que será de mim? Eu não tenho o que fazer ou para onde ir. 

Eu perdi o controle da minha vida e enquanto eu não conseguir recuperá-lo, eu também terei perdido a minha liberdade. 

Às vezes eu acho que falei, falei e não disse nada, mas essa é a vida, né? Acho que essa forma de expressão traduz até que bem a confusão da minha cabeça.

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